O que diz a nova lei sobre taxas de juro negativas?
As instituições bancárias têm, a partir desta quinta-feira, a refletir nos contratos do crédito à habitação os valores negativos das Euribor. Segundo o diploma publicado esta quarta-feira em Diário da República, “quando do apuramento da taxa de juro resultar um valor negativo, deve este valor ser refletido nos contratos de crédito”.
Num momento de taxas de juro em mínimos históricos, quem tem crédito à habitação deveria estar a ser beneficiado, o que não aconteceu porque as instituições bancárias impuserem limites para reduzirem as perdas. Assim, a intenção é criar uma espécie de crédito de juros, que compensa os titulares de empréstimos quando as taxas de juro subirem para valores positivos.
Como é que se aplica?
“O valor negativo apurado deve ser deduzido ao capital em dívida na prestação vincenda”, explica o diploma publicado esta quarta-feira em Diário da República. Significa que é criado uma espécie de fundo, em que os bancos acumulam o valor resultante quando a taxa Euribor for negativa e da adição dessa taxa ao ‘spread’ houver um resultado negativo.
Este valor será posteriormente descontado dos empréstimos, quando os juros subirem acima de zero. As instituições de crédito têm, nos próximos 10 dias, de rever o valor do indexante utilizado para calcular a taxa de juro, sendo que não serão necessárias alterações às cláusulas dos contratos de crédito à habitação.
Quando é que a regra entra em vigor?
A partir desta quinta-feira, dia 19 de junho, os bancos já são obrigados a refletir nos contratos do crédito à habitação os valores negativos das Euribor e têm até 30 de julho para rever o indexante de cálculo da taxa de juro dos créditos.
Quanto ao futuro, a lei determina que “na publicidade aos contratos de crédito à habitação e em todas as comunicações comerciais que tenham por objetivo, direto ou indireto, a sua promoção com vista à comercialização, deve ser feita referência expressa à possibilidade da taxa de juro aplicada poder assumir valores negativos em função da evolução do respetivo indexante”.
Como é que se chegou até aqui?
A nova regra resulta de um trabalho conjunto entre o Bloco de Esquerda e do Partido Socialista, que chegaram em março a um acordo para que os clientes de bancos sejam beneficiados com um crédito de juros relativo à totalidade do período em que a taxa Euribor seja negativa.
A 11 de maio, o Parlamento aprovou o projeto entregue pelo BE. O texto final, apresentado pela Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa, foi aprovado em votação final global por larga maioria, apenas com a abstenção do PSD e os votos favoráveis do PS, CDS, PCP, BE e PAN.
O que é que os bancos pensam?
Os bancos já se mostraram preocupados com a situação. “Esta regra é intrinsecamente incompatível com a natureza de um contrato de crédito – contrato de mútuo oneroso – na medida em que se traduz na eliminação da contrapartida da instituição de crédito pela cedência de fundos”, afirmou no fim do mês passado o presidente da Associação Portuguesa de Bancos, Fernando Faria de Oliveira. “A natureza onerosa do contrato mútuo não admite taxas de juros negativas, isto é, que o banco pague ao cliente pelo empréstimo que lhe concedeu”.
A vice-governadora do Banco de Portugal, Elisa Ferreira, afirmou, em abril, que está é uma questão “particularmente complexa” e difícil de prever o impacto. “São águas nunca dantes navegadas”, disse, acrescentando que o BdP não tem conhecimento de que, no espaço da União Europeia, tenham sido desenvolvidas iniciativas legislativas ou regulamentares destinadas a fixar orientações expressas quanto à forma de aplicação das taxas de juro negativas nos contratos de crédito à habitação.